Esse é o Brunno.” A empresária Ana Paula Narcizo mostra no porta-retrato a foto do filho, um rapaz loiro de 20 e poucos anos. Todos os dias, Brunno comprava balinhas em um farol perto da rua onde morava com a mãe, o padrasto e o irmão na zona sul de São Paulo. Até hoje, quando vê Ana Paula, o vendedor pergunta: “Cadê o alemão?”. “Não tive coragem de lhe contar o que aconteceu. Digo que o alemão está longe, viajando.”
Brunno gostava de ouvir a banda britânica Coldplay e adorava assistir a O Poderoso Chefão e a outros “filmes cabeça”, segundo Ana Paula. Estava estudando Direito, mas por um breve período no meio do caminho quis ser fotógrafo e fez vários registros de detalhes da capital paulista. Em outubro de 2012, aos 23 anos, Brunno se suicidou.
Um mês antes, ele acordou a mãe durante a madrugada e disse que sentia “um aperto, uma coisa estranha”. Brunno já tinha um histórico que sugeria indícios de depressão, e Ana Paula pediu que ele procurasse ajuda médica. “Marquei o psiquiatra várias vezes e ele não foi. Ele tinha vergonha de falar o que estava sentindo”, lembra a mãe. “Só depois que você passa por isso é que vê que é bem pior do que imagina. O suicídio é totalmente um tabu.”
A estreia da série 13 Reasons Why na Netflix no final de março representou de certa forma uma tentativa de quebrar esse tabu. Baseado no livro Os 13 Porquês (Editora Ática), de Jay Asher, o seriado conta a história de Hannah Baker, uma adolescente norte-americana que planeja seu suicídio e deixa fitas cassete nas quais relata os motivos que a levaram a acabar com sua vida. Bullying, exclusão e estupro, combinados com a falta de empatia de colegas, pais e professores, são alguns deles. As opiniões de especialistas sobre a qualidade do produto final divergem (veja box na página 33). Ainda assim, nenhum deles questiona que 13 Reasons Why trouxe algo que faltava ao tema: visibilidade.
O momento é certeiro. Na internet, uma notícia falsa russa sobre o Baleia Azul, um perigoso desafio cujo último passo é o suicídio, foi levada a sério ao ser traduzida para outros idiomas. As autoridades já investigam mortes de adolescentes ligadas ao jogo em Minas Gerais, Mato Grosso e Goiás, além de uma série de tentativas de suicídio no Paraná.
“Cerca de 90% dos suicídios são evitáveis. Temos um problema de saúde pública e podemos nos prevenir quanto a ele”, afirma Robert Paris, presidente do Centro de Valorização da Vida (CVV). “Quanto mais falarmos sobre o assunto, mais pessoas conseguiremos ajudar”, completa Karen Scavacini, psicóloga do Instituto Vita Alere de Prevenção e Posvenção ao Suicídio.
A abordagem da série já mostra resultados: desde a estreia, o CVV registrou um aumento de 445% nas buscas de ajuda por e-mail e 170% mais acessos ao site. “É uma oportunidade de conversarmos abertamente sobre o suicídio”, resume Paris.
Este é um trecho da reportagem da edição de maio da GALILEU.