Mais um dia de Terceira Ponte fechada. Acidente? Engarrafamento? Ninguém ali sabia ainda. Sob um sol escaldante, dezenas e dezenas de carros e motos começam a se enfileirar. Alguns motoristas já desligam seus veículos e tentam ver o que está acontecendo. Rapidamente o congestionamento cria dimensões imensas sobre a rotina da cidade.
Policiais se aproximam. Bombeiros também. “Alguém está tentando atentar contra a própria vida”, explica um deles. “Libera uma das faixas, não tenho nada a ver com esse cara”, gritou um dos motoristas parados. Pacientemente o policial explica que isso não seria possível, já que sempre tem gente que passa gritando gracinhas, tirando fotos, falando alguma coisa. Isso poderia atrapalhar todo o trabalho dos policiais que estavam ali para ajudar o homem a sair daquela situação delicada.
O tempo passa e o sol não perdoa. A explicação do policial parece não ter convencido muita gente ali. O coro engrossa e começam a surgir opiniões estúpidas sobre o fato. Alguém grita que a culpa é da Dilma. Outro esbraveja que, se Bolsonaro fosse eleito, isso deixaria de acontecer. Mais um aparece e, do alto de seus setenta e poucos anos, com uma camisa do Convento da Penha e uma medalhinha de Nossa Senhora, solta um: “Tem mais é que matar esse bandido!”. Curioso, um dos bombeiros pergunta ao senhor como ele tem tanta certeza de que o sujeito é bandido. “Não sei, mas tem de matar!”, decreta, arrancando alguns gritos de apoio.
A operação policial para salvar um homem se transformou, a poucos metros dali, em uma espécie de minitribunal repleto de “especialistas” em psicologia, comportamento humano, gerenciamento de crise e tudo mais. A cada minuto que passava crescia o número de pessoas que votavam por uma solução “rápida e fácil” para se livrar do “problema” e seguir o fluxo. Você deve imaginar qual.
Toda essa polêmica, claro, veio acompanhada de inúmeras histórias de WhatsApp que brotaram como num passe de mágica, carregando várias teorias e desfechos para o caso.
Felizmente existe o outro lado. Uma equipe de policiais, bombeiros e outros profissionais especializados em casos assim. Passaram horas ali, conversando e argumentando. Trabalho difícil, mas extremamente necessário. Conseguiram tirar o homem da ponte com vida, que aliás para um policial ou bombeiro deve ter o mesmíssimo valor da minha ou da sua vida. Espera-se que o personagem principal da trama de hoje receba tratamento adequado e retome suas atividades.
Mas tem algo cada vez mais evidente: o amor ao próximo está definitivamente em falta no mercado. Nesta tarde vi a empatia pular da ponte sem olhar para trás.