A pesquisa “Os Homens Trans no Brasil: as políticas públicas e a luta pela afirmação de suas identidades”, de Roberto Cezar Maia de Souza, da Faculdade de psicologia Maurício de Nassau, traz dados importantes e alarmantes sobre a população de homens trans brasileiros. Bem como o número de 66,4% homens trans que afirmaram já ter pensado em suicídio.
O tema é tabu, mas revela a necessidade de discutir e promover políticas públicas afirmativas voltadas para a população. Além de abordar a questão de saúde mental para homens trans.
Afinal, dos 66,4% homens trans que pensaram em suicídio, 41,5% já tiveram pelo menos uma tentativa de suicídio e 28,2% tiveram duas tentativas. Para fazer um paralelo, a população em geral tem o índice de 3% de uma tentativa de suicídio, como informa o Centro de Valorização da Vida – o CVV.
Delas, 84,5% foram por meio de medicamentos, 39,2% por meio de arma branca e 28,9% por outros meios (bem como 8% enforcamento, 6% de se jogar de lugares altos, 2% cortes no pulso…).
Em outra pergunta, 94,5% dos homens trans declararam já terem se sentido deprimidos por enfrentarem dificuldades por conta da identidade de gênero, enquanto 5,5% nunca se sentiram deprimidos. Daqueles que afirmaram ter depressão, 25,9% disseram que é muito alta, 22,8% nem alta e nem baixa, 21,5 grau alto, 17,5% grau baixo e 12,3% grau muito baixo.
De acordo com o pesquisador e psicólogo, os números trazem a tona a questão de apoio da rede de saúde mental, da qual a população de homens trans está carente. E revelam que grande parte do sofrimento psíquico vem da discriminação que existe nos equipamentos de saúde, na educação e na própria família.
VIOLÊNCIA
Na pesquisa, o psicólogo revela fatores que contribuem para o pensamento suicida, frente a uma sociedade invisibilizadora e que lida com preconceito com as identidades da população trans. O Brasil, por exemplo, é o país que mais mata travestis e transexuais no mundo, informa a ong internacional Transgender Europe.
A violência transfóbica apresenta seus dados: 71,6% dos homens trans já passaram por algum tipo de violência, contra 28,4% de pessoas trans que nunca passaram. Deste número, 94,7% já sofreram violência verbal, 38% violência institucional, 18,1% violência física e 6,4% já tiveram outros tipos de violência (bem como negar emprego, virtual e psicológica).
A própria casa é onde as pessoas mais sofrem violências (73,9%), seguida da escola (59,6%), hospital (20,5%), unidades de saúde (18,6%) e clínica especializada (17,4%).
“A maioria dos homens trans no Brasil já passou por violência verbal, institucional e física, percebemos, assim, que ainda vivemos numa sociedade transfóbica e que se faz necessário uma lei que possa criminalizar e punir esses agressores, bem como construir um banco de dados nacional para termos acesso a esses dados sobre transfobia em nosso país”, avalia.
Trabalho
Referente ao mercado de trabalho, 52,% dos homens trans revelam estar desempregados. Dos 47,5% que afirmaram estar trabalhando, 58,9% é no mercado formal, 26,6% no mercado informal e outros 14,5% atuam como DJ, INSS ou é funcionário público. De todos os entrevistados, 3% afirmam que já precisaram se prostituir.
O equipamento de trabalho também é o ambiente que mais gera sofrimento psíquico aos homens trans: 29,8%, que apresentam grande dificuldade de sustentabilidade econômica por conta da discriminação que passam no ambiente de trabalho. O dado é seguido com 22,2% nos equipamentos de saúde, 20% nos equipamentos de educação, 11% famíliar, 4% baladas e bares e 1,9% na faculdade.
O direito e respeito ao nome social é outro entrave, tendo vista que 95% dos homens trans ainda não retificaram o nome e gênero na documentação.
Deles, 88,2% disseram que tem dificuldade de ser respeito pelo nome social, contra 11,8% que não tem dificuldade. Os dados revelam ainda que muitas vezes tais constrangimentos nas famílias e nos serviços públicos fazem com que eles se afastem do convívio familiar e social.
HORMÔNIOS
A grande maioria dos homens trans considera o uso do hormônio testosterona com o grau de importância muito alto 69,7%, seguido do uso de hormônio alto 15,1%. A importância nem alta e nem baixa é de 8,8%, dentre outras opções.
Sabemos, todavia, que nem todos os Estados tem ambulatórios para pessoas trans. E que nem todas as pessoas trans podem se deslocar para ambulatórios de seus estados. Além disso, vários médicos se negam a atender pacientes trans até mesmo em convênios particulares.
Quando há dificuldade para a hormonioterapia, 45,1% afirma sentir a autoestima muito baixa, seguido de autoestima baixa 21.9%, e depois de auto estima nem baixa e nem alta 19,3%, auto estima alta 7,7% auto estima muito alta 6%.
A PESQUISA
Realizada em parceria com o Instituto Brasileiro de Transmasculinidades (IBRAT), a pesquisa contou com 242 pessoas de todas as regiões do Brasil. A metodologia empregada foi quantidade, ou seja, as informações foram colhidas por meio de um questionário estruturado.
A faixa estaria é predominante de 18 a 24 anos (41%), seguida de 25 a 34 anos (24%), 14 a 17 anos (22%), 35 a 49 (9%), 45 a 54 (3%) e mais de 65 anos (1%).
Por conta da transfobia social e da invisibilização de suas identidades, a população trans em geral carece de dados básicos, como a quantidade de homens trans existentes. Isso dificulta que políticas públicas e afirmativas sejam pensadas e criadas especificamente para atender as necessidades desta população. É por esse motivo que é importante estimular, se atentar e divulgar pesquisas e iniciativas voltadas para a população T.