Dica de leitura: “O suicídio como espetáculo na metrópole”
Nesta semana, meu texto vai falar um pouco sobre o livro da Doutora Fernanda Marquetti, graduada em Terapia Ocupacional e pós graduada em Saúde Pública. No livro “O suicídio como espetáculo na metrópole”, a autora faz um interessante estudo e trouxe uma nova forma de se pensar a questão do comportamento suicida.
Ao visitar e fotografar locais que foram cenários de suicídios em locais públicos, entrevistando também aqueles que presenciaram o evento (espectadores), Fernanda procura compreender o suicídio público (que ocorre em ruas, viadutos, trilhos do metrô, por exemplo) como espetáculo, ou seja, como forma de comunicação: “A cidade como um todo é o grande espectador do espetáculo suicida” (p. 23).
De acordo com Fernanda:
“O suicídio público surge como uma transgressão ao interdito da morte na sociedade contemporânea, na medida em que lança elementos opostos a este padrão: o evento é público, indiscreto, visível, comandado pelo sujeito, determinado em dia/hora/forma pelo sujeito, escapa do aparato de controle da morte, enfim, é a própria negação da morte silenciosa da sociedade atual” (p. 51).
Lembro que quando li esta obra pela primeira vez, fiquei impactada pelo trabalho, pois ao colocar fotografias dos locais onde os suicídios pesquisados aconteceram, Fernanda leva o leitor para a última cena.
A história de uma moça que fugiu da vigilância cuidadosa da família e entrou em um prédio desconhecido cujo portão encontrou aberto, também me marcou:
“[…] Renata veio pela rua de bicicleta, entrou pela portaria do prédio rapidamente, levando a bicicleta pela mão. Ela foi chamada pelo porteiro, mas não o atendeu e a seguir ela estacionou sua bicicleta próxima ao elevador de serviço. Depois ela pegou o elevador, desceu no oitavo andar, tirou os sapatos e se atirou do hall deste andar pela janela basculante do prédio” (p. 134).
Diz Fernanda:
“A suicida procurou um lugar calmo para se matar, com poucos espectadores na rua ou prédios vizinhos; porém, com sua estranha entrada em um prédio desconhecido marcou sua cena de forma implacável” (p. 135).
A autora reflete também sobre a escolha dos locais, como por exemplo:
“[…] o suicida procurou uma praça pública bastante caótica e descuidada como local do suicídio, e se matou exatamente no local onde o lixo da praça era acumulado. […] Nas cenas identifica-se um duplo abandono da vida: no próprio suicídio, ato que renuncia à sobrevivência, e na forma simbólica deste ato, forma que despreza o respeito básico ao corpo. Uma representação enfática do desprezo pelo corpo e pela vida, pois ambos ficam igualados ao lixo produzido pelos outros”. (p. 174).
Se o suicídio acontece no local de trabalho, na faculdade, no próprio prédio ou em um lugar distante e deserto, pretende passar diferentes mensagens sobre quem o escolhe ou para as pessoas que testemunharão o ato? Para a autora:
“Se o suicídio é construído como espetáculo, uma parte essencial deste são os espectadores. O suicida quando elabora seu ato quer deixar sua mensagem, mesmo que cifrada, para o ‘outro’ assistir ou para dele participar. Podemos antecipar que esta plateia não é escolhida ao acaso” (p. 30).
Para quem deseja ter uma outra perspectiva sobre o fenômeno, fica a dica de leitura.
Texto de Luciana França Cescon