O Ceará ficou em 5º lugar no ranking de suicídios do Brasil, conforme o 10º Anuário de Segurança Pública, divulgado nessa quinta-feira, 3, pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Com 533 casos registrados em 2015, o estado teve uma média de seis casos por 100 mil habitantes – superior à média nacional de 4,2.
O número absoluto de suicídios no Ceará foi superado apenas por São Paulo (2.058), Minas Gerais (1.279), Rio Grande do Sul (938) e Santa Catarina (630). Além disso, o Estado foi o segundo em “mortes a esclarecer”, com 1.350 casos, atrás apenas de Goiás, que registrou 1.887 casos sem esclarecimento.
A epidemia, silenciosa e devastadora, ainda apresentou crescimento de 9,2% no Estado em relação o ano de 2014, quando foram contabilizados 488 suicídios. “A gente não está fazendo a assistência adequada para identificar as pessoas que têm risco de cometer suicídio”, explica o coordenador do Projeto de Apoio à Vida (Pravida) e professor titular de Psiquiatria da Universidade Federal do Ceará (UFC), Fábio Gomes.
Há 13 anos, o Pravida oferece atendimento especializado para pacientes com transtornos mentais propensos ao suicídio. A carência de rede de atenção para as pessoas, inclusive, é uma das causas de agravamento dos índices no Ceará, conforme Fábio.
Segundo o médico, 98% dos casos de suicídios estão relacionados aos transtornos mentais: depressão, bipolaridade, dependência de substâncias químicas (álcool e drogas), esquizofrenia e síndrome de boderline (personalidade limítrofe). “Grande parte desses pacientes acham que a vida não vale mais a pena. Os dados apontam que 15 a 20% dos pacientes com transtorno bipolar morrem por suicídio”.
A quantidade dessas mortes também é significativa entre os pacientes com esquizofrenia (5 a 10%) e síndrome de boderline (3 a 5%), informa Fábio. “No caso do boderline, a pessoa tem uma dificuldade muito grande de lidar com o abandono. Sempre se sente desprotegida, idealiza muito os relacionamentos e se decepciona”, enumera.
Foi pensando em ajudar as pessoas com tendências suicidas que a agente postal Maria Alexsandra Silva, 36, tornou-se voluntária da Centro de Valorização da Vida (CVV) de Sobral, distante 250 km da capital. Desde agosto de 2015, ela cede quatro horas semanais de seu tempo para conversar com quem busca apoio emocional.
“Eu me identifico com a causa, é muito bom você ajudar o próximo, mostrar que ele pode ser capaz de superar aquela dificuldade”, afirma a voluntária. O CVV atende pessoas que querem e precisam conversar por telefone, e-mail e chat, com sigilo total garantido.
Atualmente, a sede sobralense da entidade conta com dez voluntários, mas uma nova seleção será feita na próxima semana. “Os voluntários passam por um curso integral de dois dias, com todo o acompanhamento. É uma questão de se colocar no lugar do outro, você contribui consigo”, frisa Alexsandra.
Atendimento
Para Fábio, a prevenção passa pelo apoio de familiares e estrutura governamental. “Falta assistência na rede pública, grades nos viadutos e nas pontes verticais, onde esses casos são registrados em Fortaleza. Temos um shopping que já teve dois suicídios. Outra coisa que o poder público poderia fazer é proibir a venda de chumbinho nas periferias”, avalia.
Segundo o psiquiatra, o suicídio é registrado em todas as classes sociais. “Também não tem idade, cor de pele, religião, nem orientação sexual”, afirma.
O Pravida tem uma média semanal de 20 a 30 atendimentos, mas ainda enfrenta o problema de encaminhamento. “É uma dificuldade, aqui no Estado, a gente encontrar lugares para encaminhar esses pacientes. Nós já sugerimos a implantação de um dia só para atendimentos desses pacientes”, relata.
A Secretaria de Saúde do Ceará (Sesa) informou, em nota, que a Rede de Atenção Psicossocial (Raps) e os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) estão habilitado para o acolhimento, tratamento e prevenção ao suicídio através do Projeto Terapêutico Singular do paciente. Além disso, informou que o Núcleo de Saúde Mental (Nusam) está fomentando a criação de uma comissão de prevenção ao suicídio no Estado. A primeira reunião para o desenvolvimento dessa comissão está agendada para o próximo dia 11 de novembro.
”Na comissão estão inseridos trabalhadores de vários municípios do estado, como Aracati, Sobral, Iguatu, trabalhadores do IJF, da vigilância epidemiológica, professores da UFC, membros da sociedade cearense de psiquiatria (SOCEP), dentre outros”, completa a secretaria.