Uma média de um suicídio por mês está sendo registrada entre os médicos pernambucanos em 2016. As mortes ocorrem em todas as regiões. Caruaru, no Agreste, testemunhou dois casos, além de uma tentativa. Em geral, são profissionais com mais de 50 anos, carreira sólida e família constituída. Para os outros, uma vida perfeita e uma profissão dos sonhos. Por dentro, emocional quebrantado. A frequência de suicídio entre médicos chamou a atenção do Conselho Regional de Medicina de Pernambuco (Cremepe), do Sindicato dos Médicos (Simepe) e da Associação Médica (Ampe). Eles agendam para setembro reuniões sobre o tema, com intenção de entender o cenário.
Uma estimativa da Fundação Americana para a Prevenção do Suicídio indica que, em média, 300 a 400 médicos cometem suicídio por ano em todo o Mundo. Média de uma morte por dia. Estudos internacionais apresentam ainda que os médicos têm uma frequência 2,45 vezes maior que o restante da população. Levantamentos elencam os fatores: exposição diária a situações de estresse, vivência direta com a morte e condições de trabalho precárias como alguns gatilhos para o ato. A competição e a ambição no campo profissional finalizam as características que transformam a profissão em arriscada para o suicídio.
Pernambuco não tem estatísticas oficiais sobre mortalidade provocada por médicos contra eles próprios ao longo dos anos, mas a fotografia mundial se repete aqui, de acordo com os próprios profissionais. “Temos uma vida de elevado nível de estresse. As condições de trabalho são bem complicadas. Por vezes poderíamos até dizer que são indignas. O médico lida não só com o estresse técnico, mas também com algumas escolhas que precisa tomar numa emergência. São, sem dúvida, fatores desencadeantes para chegar à depressão e ao suicídio”, assinala a vice-presidente do Simepe, Cláudia Beatriz Câmara. Ela verificou um aumento de casos de Síndrome de Burnout entre os profissionais de saúde desde 2010. A doença, conhecida como transtorno de esgotamento profissional, leva o paciente a apresentar problemas de ansiedade e até cardíacos diretamente ligados ao trabalho.
Conselheira do Cremepe e diretora da Ampe, a psiquiatra Jane Lemos ressalta que os episódios deste ano preocupam. Tanto que as entidades buscam alternativas para frear os casos. Uma das primeiras ideias é a promoção de seminários para discutir o tema. Outra é a possível articulação de um serviço para ajudar diretamente médicos com sinais de tendências suicidas. O desafio é grande, pois os profissionais são extremamente resistentes a se tornarem pacientes, principalmente quando o assunto é a própria emoção. Isso pode ser visto como um sinal de fragilidade, que entra em conflito com o sentimento de onipotência comum a esses profissionais. “Ele reluta. E, muitas vezes, se automedica. Pedem medicação ao colega, em vez de procurar um profissional habilitado para se tratar, no caso, o psiquiatra.”
Outro complicador é a dificuldade de conter uma pessoa que tem ao alcance ferramentas que facilitam a própria morte, como os fármacos. Em fevereiro, um anestesista de 52 anos se matou dentro de um hospital particular de Caruaru injetando drogas em si mesmo. O uso de um método para suicídio está intimamente relacionado com sua disponibilidade, aceitação cultural e a letalidade. Lemos chamou a atenção de que esse é o caso dos médicos. “Inclusive, algumas drogas geram dependência química, também preocupante. Inclusive, porque eles potencializam os transtornos psiquiátricos.”