Matthew Shaw estava trabalhando como jornalista em Londres em 2014 quando passou por um período de depressão no trabalho. Ele percebeu que as facilidades disponíveis a ele e seus colegas não eram necessariamente adequadas às necessidades deles.
Muitas pessoas sentiam que precisavam guardar segredo sobre seus diagnósticos.
Hoje, dois anos depois, Shaw é acadêmico visitante no Centro de Depressão da Universidade do Michigan, onde estuda como empresas podem priorizar a saúde mental.
“Muitos de nós levamos nossos problemas de saúde mental conosco quando vamos ao trabalho”, ele disse ao Huffington Post. “Eu me sentia culpado em falar disso; acho que muitas pessoas se sentem assim. Mas a verdade é que as pessoas têm problemas de saúde mental e elas vão trabalhar. Os problemas não desaparecem.”
Shaw está longe de ser o único a sentir isso na carne. Aproximadamente um em cada cinco americanos passa por um problema de saúde mental em qualquer ano, mas o assunto ainda não é discutido francamente nos locais de trabalho. Muitos profissionais guardam segredo quanto aos seus problemas, temendo ser estigmatizados – ou até prejudicados profissionalmente – se falarem em medicamentos, licença médica ou terapia com seu chefe ou seus colegas de trabalho.
“Estudos revelam que as empresas mais tolerantes dos problemas de saúde mental têm funcionários mais felizes, cuja produtividade é maior”, comentou Michelle Riba, professora de psiquiatria e diretora associada do Centro de Depressão da Universidade do Michigan, falando ao HuffPost. “Infelizmente, muitas empresas não são assim. E certos tipos de trabalho não permitem isso.”
Além do desgaste pessoal, deixar de falar de problemas de saúde mental e tratá-los abertamente é um mau negócio, diz o Centro de Controle e Prevenção de Doenças. A depressão pode gerar cerca de cinco dias de falta ao trabalho e 11,5 dias de produtividade reduzida a cada três meses, por pessoa.
Seu custo total nos EUA chega a 200 milhões de dias de trabalho perdidos, ao custo de US$17 bilhões a US$44 bilhões em produtividade perdida. Ou seja: o sucesso de uma empresa depende de seus funcionários serem saudáveis.
Modificando a cultura do trabalho
Pesquisas revelam que, quando a saúde mental é tratada, isso ajuda as pessoas a viver melhor. Quando mais à vontade os funcionários se sentem, disse Riba, maiores são as chances de buscarem ajuda para lidar com seus problemas psicológicos.
Existem leis que protegem pessoas com doenças sérias, incluindo depressão, contra a possibilidade de ser demitidas por seus problemas de saúde. Mas, para ter direito a essa proteção, o profissional precisa revelar qual é seu problema.
Especialistas dizem que, se você pode falar abertamente com seu gerente sobre uma doença física que possa ter, como câncer ou diabetes, a mesma coisa deveria se aplicar à saúde mental.
As empresas deveriam enxergar a saúde das pessoas como um todo, diz Donna Hardaker, consultora de saúde mental no local de trabalho e diretora do projeto Wellness Works da Mental Health America da Califórnia.
“As organizações precisam encarar a saúde psicológica no local de trabalho de modo estratégico”, ela explicou. “Todas as decisões relativas a funcionários, trabalho e projetos devem ser analisadas por uma lente holística, pensando em como afetam o bem-estar geral do funcionário.
Leva tempo e é preciso liderança forte para enfrentar os desafios internos que dificultam as mudanças, mas essa é a melhor solução.”
Algumas corporações já se adiantaram à nova tendência
Uma das empresas que quer lançar tendências em práticas de saúde mental é a Unilever. A empresa, que tem 172 mil funcionários, tem uma iniciativa de saúde global que se aplica a todos seus funcionários e inclui um programa abrangente adaptado especificamente à saúde mental.
O programa inclui aulas de saúde mental para gerentes e líderes seniores, campanhas internas de conscientização sobre doença mental e workshops regulares para funcionários sobre sono, mindfulness e exercício, todos esses elementos ligados ao bem-estar psicológico maior.
O objetivo da iniciativa de saúde da Unilever é acabar com o estigma que cerca a doença mental e incentivar os funcionários a procurar apoio se e quando precisarem. “Para termos uma empresa de alta performance, precisamos de funcionários saudáveis e resilientes”, disse o executivo-chefe de aprendizagem da Unilever, Tim Munden.
“Queremos que nossos funcionários sintam confiança em falar sobre saúde mental. As pessoas normalmente relutam muito em falar nisso. Queremos lhes dar um espaço para isso.”
Matthew Shaw já acompanhou iniciativas semelhantes tomadas por outras empresas que ele estudou, como parte de sua pesquisa.
Ele se surpreendeu ao descobrir que muitas grandes corporações, como American Express e Prudential, estão adotando programas de saúde mental – e, melhor ainda, os programas estão funcionando.
“Soa óbvio, mas é realmente benéfico quando funcionários seniores investem na saúde mental de alguém”, ele explicou.
“Quando essas questões ganham visibilidade em alto nível, em coisas como e-mails e conversas de gerentes, há um efeito transformador.”
O que acontece com os funcionários fora do trabalho também acontece no trabalho. Ajudar as pessoas a lidar com seus problemas é a coisa certa a fazer.”
– Tim Munden, executivo-chefe de aprendizagem na Unilver
Como outras empresas podem seguir esse exemplo
Para Hardaker, o principal é disponibilizar ajuda aos funcionários e, o mais importante de tudo, criar um espaço seguro onde as pessoas possam se abrir sobre seus problemas.
Um bom ponto de partida seria as empresas aproveitarem os Programas de Assistência a Empregados (EAP – Employee Assistance Programs), que oferecem serviços ou benefícios a funcionários com problemas pessoais ou no local de trabalho.
Os EAPs podem oferecer terapeutas ou acesso a médicos para funcionários que possam estar tendo problemas de saúde mental. De acordo com o Centro de Controle de Doenças, os EAPs são uma das maneiras mais eficazes de dar apoio a funcionários com problemas de saúde mental no local de trabalho.
Mas Hardaker disse que, para realmente fazerem uma diferença, as empresas precisam ampliar seu foco de atenção para além do programa básico para empregados e implementar workshops e treinamentos adicionais que incentivem as pessoas a pensar em sua saúde emocional.
“Para reduzir o estigma e incentivar as pessoas a buscar ajuda, não basta pendurar cartazes com um número de disque-ajuda”, ela disse. “Temos que levar as pessoas a falar desse assunto no ambiente de trabalho – por meio de treinamentos e sessões especiais – e precisamos poder oferecer sugestões baseadas em conhecimento.”
Em última análise, os programas voltados ao bem-estar psicológico de funcionários não se limitam a beneficiar os lucros das empresas. As abordagens progressistas à saúde mental no local de trabalho também fazem uma diferença positiva na vida das pessoas – e isso vale mais que lucro.
“A saúde mental é um desafio crescente na sociedade”, disse Munden. “O que acontece com o funcionário fora do trabalho também acontece no trabalho. Ajudar as pessoas a lidar com seus problemas é a coisa certa a fazer.”