Seis meses se passaram, mas os sinos da velha igreja que marcavam o andar de cada hora no distrito de Bento Rodrigues, em Mariana, na região Central, ainda cismam em tocar. Pelo menos aos ouvidos da auxiliar de serviços gerais L. M., 42, que não consegue esquecer cada detalhe de sua vida antes de a lama da barragem de Fundão invadir e destruir sua casa. Hoje, sofrendo de um princípio de depressão, ela vive sob o efeito de remédios e da esperança de um dia o pesadelo acabar. “Ainda acho que vou acordar e tudo vai voltar a ser como era. Não sei se darei conta de esquecer o que passou”, desabafa.
Assim como ela, outras das centenas de pessoas afetadas pelo rompimento da barragem da Samarco ainda sofrem com depressão ou outros problemas emocionais. Ontem, a Secretaria de Estado de Saúde (SES) informou que irá investigar, por meio do Grupo de Trabalho de Acidentes de Trabalho Ampliado e Desastres, a informação de que teria havido três suicídios – de uma moradora de Barra Longa e de dois funcionários da mineradora – e oito casos de tentativas.
“Há muitos registros de estresse pós-traumático, e temos que ter a ciência de que eles podem aumentar ainda mais, já que se caracterizam por surgirem em um tempo longo após uma tragédia. Ele ocorre exatamente quando há um processo de perda de referência ou medo do que será no futuro e insegurança”, afirmou Marta Freitas, diretora de Saúde do Trabalhador da SES.
De acordo com ela, por conta desses problemas emocionais, a pasta vai promover uma reunião do Conselho Nacional de Saúde com representantes das cidades afetadas pela tragédia. “Temos que continuar mobilizados. O problema continua, e é importante esse acompanhamento psicológico cada vez mais de perto”, acrescentou Marta.
Episódios. Presidente da associação de moradores de Bento Rodrigues, José do Nascimento de Jesus, o Zezinho do Bento, acompanhou de perto uma das vítimas de tentativa de suicídio. “Foi mais no início do acidente. Esse homem, de 40 anos, dizia que nunca deixaria o sítio dele e que morreria ali, onde os pais dele viveram. Aí infelizmente aconteceu isso. A tristeza dele foi muito forte, mas ele já está se recuperando”, afirmou.
Procurada, a Samarco informou que não teve acesso aos dados divulgados pela SES, porém salientou que mantém, em caráter permanente, nas cidades de Barra Longa e Mariana, equipes de profissionais de saúde compostas por médicos, psicólogos e enfermeiros, além de assistentes sociais.
“No caso dos atendimentos psicológicos, eles são realizados tanto por meio de consultas individuais quanto por núcleos familiares, quando há acompanhamento por assistentes sociais”, declarou em nota.