“Estranhamente Normal – A Luta de Uma Família para Ajudar Seu Filho Adolescente a Aceitar Sua Sexualidade”. Assim pode ser traduzido para o português o título do livro “Oddly Normal – One Family’s Struggle to Help Their Teenage Son Come to Terms With His Sexuality” (Gotham Books), escrito pelo americano John Schwartz.
Na obra, o jornalista do New York Times relata a história de seu caçula, Joseph, e todos os percalços que ele, sua mulher, Jeanne Mixon, e o filho enfrentaram desde a infância do garoto até a adolescência, sobretudo na escola. O pano de fundo é o fato de Joe, como muitas vezes é chamado pelo pai no texto, ser gay.
“Depois de tudo por que passamos, sentimos que outros pais poderiam se beneficiar ao ouvir nossa história”, diz, por e-mail, John Schwartz. “O livro conta o que vivenciamos ao criar Joseph e como foi ajudá-lo a superar sua própria infelicidade e isolamento, lidando com escolas e pessoas que praticavam ‘bullying'”.
É um tema muito sério. Uma pesquisa publicada no periódico científico “Pediatrics” e citada por Schwartz em “Oddly Normal” mostra que crianças LBGT rejeitadas pelos pais correm um risco seis vezes maior de sofrer com níveis altos de depressão e tentam oito vezes mais o suicídio.
“É preciso uma vigilância real na escola e nas famílias”, diz Schwartz. Ele sabe do que está falando: logo no prefácio da obra o jornalista descreve a tentativa de suicídio de Joseph, aos 13 anos, após uma querela com colegas do colégio em 2009. Joe resolveu submeter os meninos ao próprio veneno e começou a avaliá-los com notas, de maneira semelhante à que eles faziam em relação às meninas.
A turma não gostou e reclamou com um supervisor. O caso foi parar nos corredores da escola e, horas mais tarde, Joseph foi parar no hospital, depois de engolir várias cápsulas de um anti-histamínico em casa. Tudo aconteceu após o adolescente “sair do armário”, primeiro para a família e, gradualmente, no ambiente escolar. No entanto, a homossexualidade de Joseph nunca foi um problema para seus pais. Mas isso não é a regra.
“Para a mãe e o pai, não é fácil”, explica o psiquiatra Alexandre Saadeh, que é coordenador do Ambulatório de Transtorno de Identidade de Gênero e Identidade Sexual do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo. Edith Modesto, terapeuta especializada em diversidade de orientação sexual e identidade de gênero, de São Paulo, completa: “Eles geralmente não foram preparados para uma criança diferente e têm internalizado aquela ideia do menino que vai crescer, pegar todas, depois se casar e ter filhos e da menina que vai namorar um rapaz de caráter, se casar, trabalhar, ajudar o marido e lhes dar netos”.
Não raro, há os que pensam que a homossexualidade de seu descendente é provocada por problemas hormonais e aqueles capazes de contratar garotas de programa para fazer sexo com o jovem. Sem contar os que se indagam como o filho sabe que é gay se nunca transou com uma mulher. A esse questionamento, Edith, que é fundadora do GPH (Grupo de Pais de Homossexuais), retruca: “O pai já teve relações com um homem para saber se é hétero?”
De acordo com Schwartz, há muitas famílias nos Estados Unidos que rejeitam seus filhos homossexuais, como em qualquer outro lugar do mundo. “É trágico, especialmente quando você entende que o fato de ser gay está ligado a fatores que estão além do controle de qualquer um. Então, por que rejeitar uma criança, maltratá-la ou fazê-la infeliz por uma coisa que ela não pediu?”
A terapeuta Edith Modesto, que fundou o GPH em 1997 depois de descobrir que um de seus filhos era gay, fala que muitos pais que a procuram se sentem culpados por não aceitarem o filho gay. Dessa forma, ela busca fazer com que eles se sintam acolhidos nas reuniões do grupo. “Eu me apresento como um deles, como alguém que também teve dificuldade. Essa identificação é fundamental”. O trabalho com pais e filhos é feito em paralelo [ao realizado com os filhos], além de ser direcionado na reaproximação, no vínculo familiar.
A especialista lembra que, diferentemente de um menino ou de uma menina negra, por exemplo, o jovem gay, quando discriminado na escola, não ganha colo paterno e seus progenitores não vão lá reclamar. “Ele vai chorar na cama, sozinho. Não tem quem o apoie”. E se apoio é fundamental para qualquer adolescente, imagine para aquele que sente atração por pessoas do mesmo sexo.
“Todo homossexual passa por um período de sofrimento por se perceber diferente”, explica o psiquiatra Alexandre Saadeh. “Sem o amor da família, tudo é muito mais difícil para uma criança gay”, afirma John Scharwtz. Mas mesmo com o auxílio dos pais, a situação é delicada, porque a sociedade pode ser bastante dura com adultos e crianças homossexuais, diz o americano.
Para os transexuais, que desde pequenos sentem como se tivessem nascido no gênero errado, o panorama chega a ser ainda mais delicado. “São os que sofrem mais preconceito porque não são aceitos como sujeitos”, diz Edith Modesto, que aponta a carência de profissionais especializados nas peculiaridades de adolescentes LBGT como um problema no país, o que só reforça que a participação dos pais na fase de descoberta da sexualidade é essencial.
“Se o pai e a mãe percebem que o filho ou a filha são gays devem ficar disponíveis, demonstrar respeito. Respeito é o básico, aceitar é uma evolução”, afirma Saadeh.
O jornalista John Schwartz recomenda aos pais que estão procurando entender e acolher seus filhos gays, lésbicas, bissexuais ou transexuais que assistam ao vídeo “It Gets Better” (Fica Melhor, em tradução literal), no qual adultos gravam depoimentos para dizer a crianças, que talvez sejam gays, que tudo ficará melhor se elas persistirem e passarem por sua adolescência difícil.” Eu e minha mulher queríamos dizer [com o livro] para os outros pais que tudo também fica melhor para nós”.