A edição de junho da revista SAÚDE trouxe uma reportagem sobre a epidemia de depressão, que já atinge praticamente 10% da população mundial, com tendência de forte crescimento para os próximos anos. A matéria investiga as razões de tanta gente se queixar da enfermidade, considerada por muitos o mal do século. Para dar continuidade à discussão, convidamos os leitores, assinantes e seguidores nas redes sociais que já tiveram a doença a compartilharem depoimentos e mostrarem como foram capazes de superar esses momentos.
O formulário, postado em nosso site, ficou no ar por quase dois meses. Nesse período, 88 pessoas deixaram os seus comentários. Segundo os dados levantados, 35% dos respondentes têm entre 35 e 45 anos. O segundo grupo etário mais representado foi o de 45 a 60 anos, com 34% dos cliques. Por fim, 18% deles estão com 25 a 34 anos e menos de 10% possuem 19 a 24 anos.
Outra estatística que chama a atenção é o número episódios agudos de melancolia que eles experimentaram. Metade dos participantes afirma ter sofrido mais de quatro crises. Na sequência vêm aqueles que passaram por uma crise (23%), duas (13%) e três (13%).
Veja agora alguns dos depoimentos — cada um traz um ensinamento específico sobre a depressão.
Precisamos falar de suicídio
Depois de duas tentativas de suicídio seguidas de longas internações e consultas com vários psiquiatras e psicólogos, encontrei um profissional que me fez seguir tratamento corretamente. Passei a usar a medicação, fiz psicoterapia, mudei hábitos de vida (virei vegetariana), faço exercícios físicos, procuro tomar sol, viajar e estar com pessoas que me amam e que eu amo também.
M. A. (Atenção: nós retiramos os nomes dos autores dos depoimentos por uma questão de privacidade)
Sempre tive depressão. Desde cedo, só pensava em suicídio. Inclusive, tentei me matar duas vezes. Da primeira vez, fiquei internada por nove dias e, na segunda, por duas semanas. Cada vez que saía do hospital, ficava ainda pior. Até que, depois de muito trocar de médico, me consultei com um psiquiatra que usou uma combinação de medicamentos associada à psicoterapia. À medida que fui melhorando, ele foi retirando os remédios e minha vida foi adquirindo cor, sabor, felicidade… Hoje me mantenho estável com um antidepressivo apenas. Já parei a psicoterapia e trabalho a minha dor com autoanálise. É preciso salientar que não existe cura para a depressão. Existe controle. Não se pode abandonar o tratamento, pois uma recaída pode ser fatal. Nunca mais quis morrer. Só quero viver e ser feliz.
M. L.
Segundo dados da Organização Mundial da Saúde, mais de 800 mil pessoas se matam por ano. A maioria dos casos, infelizmente, tem a ver com a depressão. E isso ficou bem claro na nossa pesquisa informal. Mais de dez indivíduos relataram tentativas de acabar com a própria vida.
Onde começa o problema?
Em julho de 2014, eu trabalhava numa empresa do setor financeiro. Certo dia, cheguei em casa e simplesmente não conseguia entrar porta adentro. Um pavor tomou conta de mim. Liguei para minha mãe, que mora em outro estado, para conversar e me ajudar. Ela ficou comigo no telefone até que eu desliguei e peguei no sono. Quando me dei conta, estava cortando os próprios pulsos e olhando para ver se não conseguia cortar mais. Fiquei desesperada, liguei para a polícia e para os bombeiros. Após um longo tratamento, e graças ao bom Deus, me livrei desta horrível doença.
K. M.
A primeira vez foi de repente, não havia nada na minha vida que justificasse o fato. Comecei a ter crises de choro, ficava triste do nada. Até que veio o diagnostico. Tomei remédio e passou. A segunda crise foi após o termino do meu namoro de 9 anos. Passei por tratamento psicológico e levei um tempo pra superar tudo. Ainda vivenciei uma terceira crise quando perdi minha mãe. Consultei um psicólogo e tomo medicamentos desde então.
A. C.
Na grande maioria das vezes, o paciente não consegue precisar aquilo que deu início a uma crise depressiva. É comum ela surgir do nada, sem nenhum motivo aparente. Mas há aqueles casos em que a morte de um ente querido, um abandono ou uma demissão são a gota d’água para um processo de tristeza que se arrasta por meses a fio.
Início precoce
Tudo começou quando eu tinha 11 anos. Algumas mudanças em minha vida ajudaram a desenvolver a doença. Passei a infância sofrendo com preconceito por ser mais gordinha. Até que na adolescência tive anorexia e fiz inúmeras automutilações. Aos 15 anos estava no auge da minha crise e cheguei a ficar mais de duas semanas apenas ingerindo água e leite. Minha mãe buscou ajuda de psicólogos e psiquiatras, o que me levou a um tratamento intenso até receber alta provisória. Dos 16 anos até os 20 estive em uma fase tranquila e sem crises. Porém, no meu último ano de faculdade, comecei a atolar novamente na melancolia. Após dois anos e o fim de um relacionamento abusivo, voltei a estudar e trabalhar. Isso aumentou meu círculo de amizades e me reaproximou da família. Também comecei a trabalhar meu amor próprio e a viver novamente.
M. G.
Sempre fui uma criança ansiosa. Após uma série de acontecimentos na minha vida, desmoronei. Desde a adolescência tive várias crises, mas todo mundo achava que era questão da idade. Foi na fase adulta que as coisas ficaram insustentáveis. Eu não saía, não conversava… Minha vida era o trabalho e, mesmo assim, ia me arrastando até o emprego. Resolvi procurar um médico e iniciei a medicação. Logo comecei a namorar e fui promovida. Fui transferida de cidade e tudo voltou a piorar. Tive vários tipos de infecções por estar com a imunidade baixa. Tive síndrome do pânico e quase me matei várias vezes. No meio de tudo isso, meu namorado me pediu em casamento. Tive outras crises desde então, mas recomecei o tratamento e aprendi a controlar melhor a minha mente. Hoje meu casamento está ótimo e conquistei meu emprego de volta.
I. S.
É curioso notar também a idade com que muitos começaram a sofrer de depressão. Não foram poucos os relatos que diziam sentir uma tristeza imensa desde os períodos da infância ou da adolescência.
O tratamento é essencial
Após uma grande decepção, fui acometida por uma crise de ansiedade e depressão que durou um ano. Nesse período quase tranquei minha faculdade e desisti de meu estágio. Minha saúde ficou em péssimas condições e eu perdi bastante peso. Tinha insônia e ataques de pânico. Tentava me adaptar às terapias, que mais pareciam prejudicar do que melhorar. Os remédios passados pelo meu psiquiatra faziam com que eu perdesse o controle sobre minha própria mente. Foi um ano difícil, de passos lentos, mas a melhora de fato chegou quando aliei os remédios a uma recuperação espiritual. Tudo ficou mais favorável quando conheci um psiquiatra que respeitava as minhas observações sobre os medicamentos. Mas a depressão é como um vício: de certa forma, você vive um dia de cada vez.
F. G.
Eu não sentia vontade de acordar, de levantar da cama, de comer, enfim, de fazer nada. Era um vazio, um peso que eu carregava nas costas. Fiz tratamento com remédio controlado e psiquiatra. Mas houve uma época em que tomar o remédio já não adiantava mais nada. Eu superei quando estava muito cansada de tudo e pedi pra Deus me levar embora. Foi justamente pela fé que me levantei e me fiz outra pessoa.
R. M.
Posso dizer que convivo com a depressão. Se deixar de lado os cuidados que hoje eu tomo, eu mergulho nela novamente. Desde a adolescência tomo medicamentos e sofro bastante com as crises. A cada nova recaída, eu procuro relembrar como saí da última e aplico as mesmas estratégias, que consistem em medicação, psicoterapia, muita meditação e tratamento espiritual. É sempre angustiante assumir para o outro aquilo que se passa comigo. Muita gente nem sabe que eu passo por isso. Depois de ler sobre alimentação e depressão, procurei uma nutricionista, que me explicou a importância de um intestino saudável para combater a crise. Assumir minha condição perante as pessoas e pedir ajuda foi fundamental.
C. A.
Os textos que recebemos destacam a importância do diagnóstico correto. Há sujeitos que fazem uma verdadeira via-crúcis por vários especialistas antes de receber a confirmação da doença. Isso sem contar o preconceito envolvido na depressão… Tem muita gente que ainda acha, de forma errada, que o paciente tem falta de vontade ou falhas de caráter. Mas ainda bem que os remédios, a atividade física e até a espiritualidade são aliados na luta contra o distúrbio.
Por motivo de clareza ou espaço, as cartas podem ser publicadas resumidamente.